segunda-feira, 16 de maio de 2016

Linda Martini
"Sirumba"

Felizmente, não há aulas amanhã 


Os Linda Martini estão diferentes. Uma década depois de “Olhos de Mongol”, o caminho traçado pelo quarteto composto pelo André, a Cláudia, o Hélio e o Pedro (sem nunca esquecer o Sérgio) foi percorrido de forma sonora e liricamente consciente e em crescendo.

As raízes punk e pós-rock fundiram-se e deram origem a um som próprio que foi, paulatinamente, conquistado os nossos ouvidos. Se “Casa Ocupada” é um disco mais direto e cru, “Turbo Lento” traça ambientes com maior groove assumindo-se como um misto de fúria e paixão únicos, uma delícia sónica ao serviço de uma sagaz militância musical.

De degrau em degrau, numa escala ascendente, chegamos então a “Sirumba”. Gravado com outras condições, emocionais e de trabalho, o quarto disco dos Linda Martini resulta de uma maior dedicação a causa própria. Com um estúdio à sua disposição e com todos os membros da banda exclusivamente dedicados à arte de fazer música, estavam, finalmente, reunidas as tão desejadas condições.

E o resultado do trabalho que teve como casa o estúdio HAUS é um grande disco, uma excelente coleção de canções, fruto também de uma maior coesão, comunhão mesmo, entre a música e a voz, não sendo estéril que se grite em “Sirumba”, faixa que abre o álbum, «Faço gala, eu quero é ser cantor». Para trás, ficam os tempos de quem tinha aulas no dia seguinte…

Ao longo dos nove temas de “Sirumba”, sente-se também que houve mais atenção à evolução da própria música, à sua construção rítmica, e em determinados momentos agarram-se influências de outros quadrantes, principalmente em apontamentos mais “orientais” das guitarras (“Comer Por Dois”) ou tiques assumidamente tribais na bateria (“Dentes de Mentiroso”), aos quais a “dicotomia” Linda Martini/Paus não é, definitivamente, alheia. A presença, algo tímida, de uma secção de sopros em faixas como “Unicórnio de Sta. Engrácia” e “Farda Limpa” apontam também uma maior universalidade da linguagem de uma banda que teve tempo, e engenho, para ser mais.

Dessa amálgama criativa nasceram algumas das melhores canções (termo hoje utilizado com maior propriedade) da história da banda onda há mais espaço para uma sensual contenção e compromisso de implosão. “Bom Partido” é um desses exemplos, melancólicos. A voz entra, devagar, as guitarras disputam entre si acordes atmosféricos, a bateria e o baixo namoram delicadamente enquanto se divaga sobre o difícil ato de crescer, de ser adulto. A sensação repete-se em “O Dia Em Que A Música Morreu”, derradeiro suspiro do disco, um exercício deliciosamente sufocante que promove uma sensação de montanha-russa, entre crescendos e travagens, «andando em lume brando», que promovem um fascinante dialogo entre músicos e ouvinte. Uma pérola que navega em territórios muito semelhantes à tensa, e densa, “Dentes de Mentiroso”, canção que observa alguns dos minutos mais sónicos de “Sirumba”.

As mais orelhudas, e em registo radiofriendly, “Putos Bons” e “Unicórnio de Sta. Engrácia” valem-lhes o estatuto de primeiros singles e mostram um doce e irresistível swing, manobras que alargam o espetro do som dos Linda Martini a territórios muito próximos de uma acelerada pop particularmente interessante que reina sem dividir.

Correndo o risco, assumido, de cair no cliché de dizer que “Sirumba” é o disco mais maduro e seguro dos Linda Martini, essa é a sensação que fica depois de se devorar, quase sem tréguas, este conjunto de canções nascidas da cabeça do quarteto cuja emocional envolvência com as suas músicas nos leva a tratá-los por tu e a pedir que nos continuem a oferecer canções que fortaleçam os nós que afinal sabemos dar, mesmo que para tal tenhamos de esperar, anos, vidas inteiras que se renovam. Obrigado, rapazes.
 

Alinhamento:
1.Sirumba
2.Unicórnio De Sta. Engrácia
3.Preguiça
4.Putos Bons
5.Bom Partido
6.Farda Limpa
7.Comer Por Dois
8.Dentes De Mentiroso
9.O Dia Em Que A Música Morreu

Classificação: 9,5/10

Editora: Universal

In Palco Principal

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