segunda-feira, 13 de julho de 2015

NOS Alive'15, dia 3

Dia de sotaque britânico


No derradeiro capítulo de NOS Alive'15, foram muitos e bons os concertos que aconteceram no Passeio Marítimo de Algés, que tiveram como denominador comum o sotaque britânico, com algumas honrosas exceções vindas dos Estados Unidos da América e Austrália. Se, logo no início, os irreverentes Sleaford Mods gritaram que o punk está bem vivo e recomenda-se, os portugueses Dead Combo mostraram como é fácil golear a jogar em casa e Azealia Banks não teve pudores: arrebatou e fez dançar. Pelo meio, os Mogwai deram um espetáculo cheio de força, Sam Smith encantou muitos milhares, os The Jesus and The Mary Chain recuperaram “Psychocandy”, Chet Faker entreteve as massas durante uma horita e os Disclosure, em formato live, demonstraram que estão em grande forma.

Sleaford Mods | 18h30, Palco Heineken

Vamos tentar explicar. Imaginemos um cruzamento entre Jello Biafra, Paul Gascoigne, spoken word, hip-hop minimalista e eletrónico, hardcore, um microfone, um computador, uma cerveja e uma garrafa de água. O resultado é, mais coisa menos coisa, os britânicos Sleaford Mods, uma dupla de Notthingham composta por Jameson Williamson (voz) e pelo “maestro” Andrew Fearn (programações), que trouxe ao palco Heineken a mais radical experiência punk da história do Alive.

Fruto de uma conjugação hipnótica de elevadas porções de niilismo, uma forte contestação social e uma descontração muito britânica, Jameson e Andrew chegaram ao palco como desconhecidos e saíram dele como um projeto que faz sentido, que primeiro se estranha, depois entranha, faz dançar e dizer cheers.

Entre “Silly Me” e “Tweet Tweet Tweet” passou pouco mais de meia hora e, desde que Fearn tocou no computador (nota de rodapé: Fearn, de cerveja na mão, passa o concerto a olhar para o público, a cantar para si e raramente toca na sua “máquina de ritmos”) e Jameson se fez ao microfone, é impossível resistir ao carrossel punk e “hooligan” dos Sleaford Mods, bem doseado pela rodopiante dança do vocalista, que encontra força e fôlego numa garrafa de água e numas bastas sacudidelas de cabelo com a mão, ingredientes principais num intenso ritual “autista” em forma de discurso contestatário.

Pelo caminho ficaram momentos como “Bunch of Counts”, “Live Tonight”, “Middle Men”, “Jolly Fucker”, “Tied Up in Nottz”, “Fizzy” (com dedicatória especial ao governo britânico) e “Jobseecker”, havendo também tempo para o novo single, “Tarantula Deadly Cargo”.

Rebeldes com causa, os Sleaford Mods são, mais do que uma banda, uma expressão urbana, um grito urgente e político, e um fenómeno a ter em conta. Afinal, punk’s not dead!

Dead Combo | 19h40, Palco Heineken

Neste último dia de NOS Alive 2015, olhando para o cartaz e respetivos palcos, os cardápios estavam delineados sem mácula, pois se, por exemplo, houvesse quem procurasse uma jornada mais “indie”, não precisava de sair do Palco Heineken. E, tal como há dois anos, neste mesmo lugar, os Dead Combo voltaram a dar um concerto inspiradíssimo, percorrendo um pouco de toda a sua discografia, mas com uma aproximação mais rock, pois Tó Trips e Pedro Gonçalves tinham como convidados, na bateria e precursões várias, respetivamente, Sérgio Nascimento e Isaac Achega.

Como habitual, sentada junto ao seu “fúnebre” altar decorado com flores, caveiras, e artefactos vários, a dupla iniciou hostilidades com o agitado “Cacto”, seguiu trajeto com o dolente “Rumbero”, fez abanar mentes e corpos com “Rodada”, num piscar de olhos ao universo do western spaghetti, e não perdeu oportunidade de revisitar “Bunch of Meninos” através de uma excelente versão de “Waits”, um elogio à parcimónia blusy do ontem quarteto, que libertava uma energia que contagiou as felizes almas que estavam no palco Heineken.

Enquanto uma tela nas costas do coletivo exibia imagens que contextualizavam os acordes, a viagem continuou com mais uma pérola retirada do último álbum de originais, a tropical “Hawai em Chelas”, que antecedeu dois dos mais brilhantes momentos da atuação: os já clássicos, alguns com dedicatória às "nossas miúdas", “A Menina Dança” e, talvez a melhor peça de filigrana nascida das mentes de Trips e Gonçalves, “Povo que Cais Descalço”, um exercício lindíssimo de um fado especial, tocante e maravilhosamente oferecido.

Numa apresentação que apenas pecou pela escassez de tempo (não ultrapassou os 50 minutos), tivemos a felicidade de ainda ouvir “Elétrica Cadente”, dançar com “Lisboa Mulata” e, para o final, com a bandeira grega em fundo e os ecos de um certo “oxi!” na memória recente, “Zorba the Greek” encerrou um grande concerto.

A moda dos calções, os calções da moda e outras indumentárias do NOS Alive 2015

Os festivais de música também são exímias passarelas de moda. Aqui criam-se tendências, absorvem-se tendências, marcam-se tendências, sendo as principais marcas presentes as principais responsáveis das direções tomadas. Se num ano optam por oferecer aos visitantes lenços para colocarem à volta do pescoço, toda a minha gente vai andar de lenço ao pescoço. Se no ano a seguir optarem por oferecer chapéus de palha aos visitantes, toda a minha gente vai andar de chapéu de palha. E por aí em diante.

Porém, a questão consegue ser bem mais complexa do que isso. A tendência vai ao ponto de – à imagem do rebanho que segue o seu pastor sem saber bem porquê – obrigar ao uso de indumentária x ou y porque está na moda, sob pena de, no caso de não obedecerem à norma estabelecida no Decreto-Lei para festivais nº42/2015, serem para sempre banidos da comunidade festivaleira. Os mini-calções da moda são um bom exemplo disso. Mesmo não ficando bem em toda a gente, toda a gente os usa, deixando à mostra partes do corpo que, por um lado já extravasam o conceito de sensualidade, por outro mostram ao mundo que não foi feita a devida pré-época estival no ginásio.

Mas, como nem tudo é um mar de espinhos, ainda há quem tenha conseguido imprimir um cunho pessoal nos trajes que escolheu para o festival. Para além das habituais t-shirts alusivas às bandas (há umas de Muse, com toda a digressão detalhada nas costas; outras de Prodigy e ainda umas de Disclosure, para além dos habituais clássicos de Nirvana, Metallica, AC-DC, Faith No More e até Run-DMC), há aquelas célebres t-shirts que distorcem os nomes das marcas (o resultado final está, normalmente, relacionado com drogas, comas alcoólicos ou frases de engate à trolha). Um pouco para todos os gostos.

Por outro lado, há quem exagere na excentricidade das indumentárias, marcando, por isso mesmo, a diferença. Há quem se vista à punk, parecendo ter saído de um concerto no CBGB, há quem se vista à hippie, parecendo ter viajado no tempo de 1969 para os dias de hoje e há quem exiba umas dreadlocks de fazer inveja ao mais dedicado rastafari. Vimos ainda um conjunto de rapazes com uns fatos de patinho de borracha (a dada altura, fazem uma espécie de centopeia humana na plateia no palco principal – WTF??!!), uma super-mulher (super-homem, ou lá o que era aquilo), umas vaquinhas malhadas, uns dinossauros e outros pormenores capazes de chamar à atenção pelas melhores razões. Há que saber distinguir o original do banal.

Sam Smith | 21h00, Palco NOS

A lição que Sam Smith trouxe ao NOS Alive foi simples: é possível servir bons concertos sem ter que transformar o recinto numa pista do Pacha ou numa festa de reveillon madeirense. Basta fazer uso daquilo que realmente vale e que, até ver, ainda é o mais importante nestas andanças: a música ter uma boa dose de carisma, ser bom comunicador (não basta pendurar a bandeira do país que visita ao pescoço e passear-se em palco como forma de homenagem local), ter uma boa banda de suporte já é meio caminho andado para o sucesso. Os outros 50% ficam na mão do público. Se este estiver para aí virado, tudo bem. Se não estiver, paciência.

No caso de Sam Smith, a empatia foi imediata. A sua entrada em palco, de sorriso rasgado, visivelmente satisfeito com o facto de estar de volta a um dos seus “festivais preferidos” (no ano passado tinha atuado no palco secundário; este ano, saltou para o principal – não há músico que não se sinta realizado ao inteirar-se destes progressos na carreira), quebrou, juntamente com as histórias de amores e desamores que fez questão de partilhar com o público (as suas inspirações para o álbum), a barreira que frequentemente se ergue entre palco e plateia, criando um laço de cumplicidade que durou até ao final da atuação.

“I’m Not The Only One” é a primeira do alinhamento. Há pessoas que arrancam a correr em direção ao palco de forma desenfreada, para não perderem uma letra que seja da música. Há muitas raparigas – mas também muitos rapazes – a quererem garantir a proximidade de Sam Smith, afinal de contas, estamos perante uma estrela internacional, vencedora de um Grammy para Melhor Música (“Stay With Me”, uma das mais celebradas do alinhamento) e Artista Revelação do Ano, entre outros. Entenda-se a loucura.

À medida que vai interpretando temas do seu álbum de estreia, “In The Lonely Hour”, Sam Smith vai introduzindo as músicas e explicando como surgiram e a importância que tiveram em certas fases da sua vida. Diz que “Leave Your Lover” é umas das suas favoritas do álbum, que “Lay Me Down” é dedicada a um rapaz que lhe partiu o coração por completo e que “Money on My Mind”, tema de abertura de “In The Lonely Hour”, é a única canção que não fala de amor. A dada altura, partilha com o público os problemas que teve de identidade, em assumir quem realmente era (a referir-se, certamente, à descriminação que ainda existe em torno da homossexualidade). É um concerto, mas podia muito bem ser uma conversa ou um desabafo. Um relato de vida.

Há tempo ainda para uma homenagem à falecida Amy Winehouse (uma baixa insubstituível na história da música), com "Tears Dry On Their Own”, e uma passagem por “Le Freak (Freak Out)”, dos Chic, e “Ain’t No Mountain High Enough”, de Marvin Gaye e Tammi Terrell. Por esta altura, Sam Smith já tem o público completamente na mão, o que faz com que “La La La”, tema de Naughty Boy ao qual o vocalista empresta a voz, seja apenas de consolidação junto dos milhares que assistem atentos e participativos na plateia. Todos cantam. Todos dançam. Todos aplaudem.

Mas a apoteose acabaria por vir em “Stay With Me”, tema cantado a plenos pulmões em todo o recinto, levando o próprio Sam Smith a emocionar-se, de lágrimas nos olhos, perante tamanha adesão. É que não houve vivalma que não soubesse a letra de cor e não participasse neste magnânimo coro. De arrepiar.

Mogwai | 21.10h, Palco Heineken

É preciso recuar até à já longínqua edição de 1999 do Festival Paredes de Coura para recordar a primeira vez que os escoceses Mogwai pisaram o território luso. Na memória ficou um concerto quente, cujo alinhamento explorou com grande avidez dois dos maiores símbolos discográficos da história do movimento post-rock: “Young Team” e “Come On Die Young”.

No ano em que comemora 20 anos de estrada, música e muitos palcos, a banda de Stuart Braithwaite e companhia chegou a este NOS Alive 2015 com uma vontade de dar a conhecer o seu riquíssimo catálogo musical, unindo passado e presente, guitarras ao desalinho com laivos recentes de eletrónica, e um carisma sonoro que nos transporta para um Olimpo repleto de pedais distorcidos, feedbacks em espiral melódica e outros desvarios típicos do ADN post-rock.

Os primeiros acordes surgiram com “White Noise”, faixa retirada de “Hardcore Will Never Die, But You Will”, mas, lamentavelmente, o som não ajudou muito na fase inicial do concerto. Ainda assim, essa questão foi sendo revolvida gradualmente e pudemos assistir a uma boa performance dos Mogwai, agora versão sexteto, devido à inclusão de Luke Sutherland, escritor e músico inglês, que tem acompanhado a banda.

Envolto de um misterioso ambiente sónico, “Summer” fez recuar até aos iniciáticos tempos de “Young Team”, com os cortantes riffs a contrastarem com momentos mais contemplativos, numa espécie de montanha-russa auditiva, plena de emoção, que nos faz subir e descer a pulsação a um ritmo frenético - sentimento esse que encontrou eco na muito aplaudida versão de “I’m Jim Morrison I’m Dead”, um exercício que inicia com um piano quase onírico mas que acaba por terminar num saudável e melódico frenesim. Mais agressivo, “Rano Pano”, um regresso a “Hardcore Will Never Die, But You Will”, fez sobressair a bateria de Martin Bulloch, ainda que nunca retirasse espaço ao espetro sónico, agora assombrado por salpicos eletrónicos, característica essa que teve expoente máximo com “Mexican Grand Prix”, a lembrar os ritmos mais dançáveis de uns Joy Division.

“Hunted By Freak”, faixa que abre “Happy Songs for Happy People”, tornou a atmosfera mais negra e a esta penumbra sónica juntou-se o violino de John Cummings, que momentaneamente abandonou a guitarra. O público reagiu com muitas palmas, que se adensariam com os primeiros acordes de momento épico que é “Mogwai Fear Satan”, uma das maiores e melhores composições da banda escocesa. O resultado é um longo caleidoscópio que provoca calafrios, acelerações cardíacas, espasmos de energia, um desejo de explodir num qualquer céu estrelado.

Até ao final, ainda ouvimos “Teenage Exorcist”, com Braithwaite ao microfone, “Remurdered”, sacada do alinhamento de “Rave Tapes”, e, como remate final, a deliciosa “Batcat”, com direito a repetição devido a problemas técnicos com uma das guitarras, mas que, resolvida a situação, funcionou com um epílogo hardcore exuberante.

Feitas as contas, analisados os prós e contras (técnicos), o saldo é muito positivo - nada que se estranhe da assinalável mestria desta banda, pois eles são os "Mogwai, from Glasgow, Scotland".

The Jesus and Mary Chain | 22h35, Palco Heineken

Quem gosta realmente de música, aprendeu a crescer com ela, com os seus ensinamentos, histórias, heranças e raízes. Com o passar dos anos surgem novas bandas, movimentos, são criados estilos mas não é todos os dias que temos a oportunidade de ver ao vivo quem está na génese de um estigma criativo, de uma imagem única que inspirou gerações a pegar em guitarras, baixos e bateria, e ter o pretensiosismo de formar uma banda.

É por isso um prazer (re)ver os agora grisalhos irmãos Jim e William Reid, que ousaram, no início da década de 1980, formar uma banda que, também ela, se inspirou nos universos de gente como os The Stooges, The Velvet Underground ou The Beach Boys e fez alguns dos melhores discos da rica história da música alternativa. E foi para apresentar, na íntegra, um desses brilhantes tomos, que os The Jesus and The Mary Chain subiram ao palco Heineken e abriram a caixa de Pandora que foi, é e será, sempre, “Psychocandy”, um disco de 1985 mas que continua a soar a novidade.

Para dar as boas-vindas aos escoceses, reuniu-se um palco Heineken bem composto, sem estar cheio, com gente que seguramente abraça e ultrapassa a ternura dos quarenta e está de alma aberta para receber o negrume dos feedbacks de William e o sussurro vocal de Jim.

De uma maneira que afastou fantasmas de anteriores concertos em formato vamos-lá-despachar-isto-rápido, os The Jesus and Mary Chain exploraram literalmente o filão de “Psychocandy” e, com muito fumo à mistura, o palco transformou-se num santuário sónico de melodias que cruzam mel e fel, saudade e sorrisos tímidos.

Logo a abrir, “Just Like Honey” fez com que não fosse preciso beliscarem-nos, pois, mais do que um sonho, era um concerto de The Jesus and Mary Chain e, ao longo de mais de uma hora (oxalá fosse mais…), sentimos batidas seguras, guitarras em louvor de pedais abençoados pelas divindades feedbackianas e uma atitude expressiva (ou não) q.b. por parte dos principais protagonistas.

Depois foi abrir ouvidos e alma e deixar entrar o som trashy de “The Living End”, “In a Hole” ou “Never Understand”, a densidade de “Taste the Floor”, o espectro sónico da belíssima “Taste of Cindy”, a urgência surf de “The Hardest Walk”, o elogio ao baixo que são “Inside Me” e “Something’s Wrong”, as mais doces “Sowing Seeds” e “Cut End”, a melodia de “You Trip Me Up” e o longo e denso suspiro que é “It’s so Hard”. Tudo isto embrulhado com assinalável entrega (é preciso dizer também mestria?), reconhecida harmonia vocal, muito fumo e um jogo de luzes que transformou o palco num altar de tons cinzentos, onde a luminosidade era, acima de tudo, sonora.

Depois de “Psychocandy”, tivemos ainda o privilégio de ouvir mais três peças da história da banda. A saber: “Head On”, “Some Candy Talking” e, por fim, “Reverence”.

Chet Faker vs Azealia Banks: um verdadeiro choque térmico

Não há nada que se possa dizer do concerto de ontem de Chet Faker que possa acrescentar alguma coisa ao que foi dito e escrito relativamente às duas datas no Coliseu dos Recreios. É um músico talentoso, um verdadeiro sonoplasta multifacetado: constrói canções, manipula-as à sua maneira, mete efeitos, sobe faders, roda botões. E, quando é altura de cantar, não falha. Servem de exemplo temas como “I’m Into You”, “Talk Is Cheap” e a cover de Blackstreet, “No Diggity”. Até aqui tudo bem.

Porém - e desculpem-nos os fãs mais afincados, ou mesmo aqueles que não tiveram hipótese de o ver nos Coliseu e encontraram nesta passagem pelo festival uma bomba de oxigénio -, este não era o concerto indicado para esta hora, para este ambiente, para este palco. A música de Chet Faker é perfeita para sunsets nos bares de praia da Costa da Caparica ou fins de tarde nas esplanadas dos cafés das docas lisboetas - não é para ser encaixada com calçadeira entre Sam Smith e Disclosure. Nem tão cedo perdoaremos esta falha de Stromae...

A passagem do concerto de Chet Faker para o de Azealia Banks equiparou-se àquelas alturas em que entramos dentro de uma banheira de água quente sem preparação prévia. Por esta altura, Azealia Banks levava a tenda Heineken ao rubro com os seus temas vibrantes, carregados de subgraves (sub, sub, sub e mais sub), ao bom estilo de Missy Elliot, e com a sua presença contagiante em palco – bem como a dos seus bailarinos. Estão a ver aquelas festas nos clubes nova iorquinos carregados de pessoal até não poder mais e com um ambiente de cortar à faca? Nada a ver. Este é o ambiente perfeito para quem gosta de rap pelos contornos meramente musicais, ainda que as letras de Azealia Banks não tenham muito sumo para espremer - veja-se o caso de temas como “Yung Rapunxel”, “Bbd (Bad Bitches Do It)” e “Desperado”. O concerto ideal para a hora, espaço e público em questão.

Disclosure | 01:00, Palco NOS

Já vimos neste palco muitos espetáculos de música electrónica, como Chemical Brothers, The Prodigy, Duck Sauce, Steve Aoki (a cantar desde 1919....), LCD Soundsystem, e outros que a memória já não consegue alcançar, e garantimos: este foi, de longe, um dos melhores.

Luz e vídeo sóbrios, sem grandes extravagâncias e sem, voltamos a repetir, transformar o recinto numa discoteca parola (não há tartes nem confetis, nem serpentinas, nem vuvuzelas, nem pirotecnia pacóvia, nem bolas, nem o raio que o parta). Há linhas de luz robotizada que sobem e descem consoante as músicas, há todo um cenário de leds que vai ilustrando a atuação do duo (houve mesmo um gato a atravessar o ecrã de um lado ao outro, ou foi mera alucinação?), e, claro, há todo um conjunto de canções orelhudas, dentro do limite do aceitável, capazes de levar multidões ao êxtase.

Iria este concerto dos Disclosure aproveitar a presença de Sam Smith para uma participação no tema “Latch” e, quem sabe, para estrear ao vivo a nova música que o coletivo se prepara para tornar pública? Esta era uma das maiores incógnitas de todo o festival. Incógnita essa que se evaporou no momento em que o coletivo se atirou a “Latch”, já no encore, sem que Sam Smith tivesse entrado em cena (vem, não vem, no verso, no refrão – nada....). Foi pena, mas não evitou que a festa se fizesse na plateia, até porque foi o próprio público a tomar as rédeas da canção e mostrar que ainda havia energias de reserva para garantir que o duo britânico voltasse a sair de Portugal com boa impressão - umas juras de amor entre palco e plateia acabaram por garantir que o sentimento era recíproco.

Kwabs, o homem de “Walk”, acabou por ser o único convidado da atuação, tendo-se juntado ao duo para dar voz a “Willing & Able”, um dos temas novos que o coletivo trouxe para o concerto.

Ver DJs ou produtores atuarem em formato live deixa sempre uma incógnita no ar: mas estarão eles realmente a fazer alguma coisa? Ou será apenas um excelente exercício de coordenação e mímica? Se muitas vezes desconfiamos das rainhas (e reis) da pop quando sobem ao palco e protagonizam concertos irrepreensíveis a nível vocal, porque não desconfiar do pessoal que se esconde atrás de um deck de CDs ou de um móvel recheado de samplers, computadores, sintetizadores e mais uma data de aparelhos dignos de um cockpit dos mais avançados Boeings? Será sempre um gigantesco ponto de interrogação. Na atuação dos Disclosure houve coisas tocadas; outras pré-gravadas, não sabemos ao certo o quê, mas também não é assim tão relevante.

Do alinhamento do duo fizeram parte temas como “White Noise” (a primeira de todas, a estender a passadeira vermelha a “F for You”), “You and Me”, “When a Fire Starts to Burn”, “Help Me Loose My Mind” (uma das mais belas de “Settle”) e “Grab Her”. Houve espaço para outros temas novos, como “Bang That” e “Holding On”, pastilhas efervescentes para a pista de dança, a seguirem a mesma fórmula e a resultarem ao mesmo nível das mais antigas. No final da atuação, depois de uma celebradíssima “Latch”, que não deixou ninguém indiferente (visto aqui de baixo, até na zona VIP há pessoas atentas e a dançar, por mais incrível que pareça), a expressão de satisfação era geral. Estava assim concluída mais uma edição do NOS Alive, pelo menos para nós, pois as tendas Clubbing e Heineken ainda propunham música até às tantas.

Com Manuel Rodrigues

Fotografias: Marta Ribeiro e Rita Bernardo

In Palco Principal

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