segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

“A Chave de Salomão”
de José Rodrigues dos Santos


Na página 350 de “A Chave de Salomão” (Gradiva, 2014), depois de uma intensa conversa sobre Física entre Tomás Noronha e Maria Flor, o historiador afirma: «O universo é uno.» A leiga Flor fica surpreendida com tal afirmação mas não desarma e pergunta ao camarada de aventura e conselheiro da Fundação Gulbenkian o que tal significa. Noronha é então peremptório e diz estar mais perto de resolver o enigma.

A referida declaração resume o quinto congresso Solvay, realizado em 1927, que colocou frente a frente gente como Albert Einstein e Niers Bohr, cientistas que ilustram a capa “escondida” do mais recente romance de José Rodrigues dos Santos, um livro que transporta o leitor para uma alucinante viagem entre a ciência e a filosofia e cuja génese é a morte de Frank Bellamy, director de Tecnologia da CIA.

Inesperadamente, o corpo do norte-americano é encontrado no CERN, em Genebra, quando cientistas procuram o bosão de Higgs, também apelidado de Partícula de Deus. Para além do trágico que a morte de Bellamy encerra, o mistério cresce dado que a vítima foi encontrada com a estranha mensagem: «The Key: Tomás Noronha.» Sem nunca o esperar, Noronha assume-se como o maior suspeito da morte de Frank Bellamy e apenas resta ao português tentar demonstrar a sua inocência. Ciente de que Tomás é o homicida, a CIA lança uma autêntica caça ao homem e o historiador vê no seu encalce homens contratados pela agência norte-americana.

Misto de fuga e desesperada viagem, a demanda de Tomás Noronha, na companhia da bela Maria Flor leva a dupla a percorrer séculos de descobertas científicas, que têm a Física como o maior elo aglutinador. Mas pelo meio, outras dívidas surgem: como será a vida depois da morte? A alma existe? O que é, de facto, a realidade?

Fruto de uma intrincada investigação, “A Chave de Salomão” leva o leitor para o interior de um universo que mescla conceitos como a consciência e a realidade e, apesar de ser um livro de ficção, a informação científica é genuína. Rodrigues dos Santos escreve, nas primeiras páginas do livro, que «todas as teorias e hipóteses apresentadas são sustentadas por cientistas.»

O ritmo das páginas de “A Chave de Salomão” pauta-se por um registo dinâmico – frenético até – e cativa o leitor desde as primeiras frases, que revelam em si situações repletas de acção, peripécias várias e, por vezes, longas e pormenorizadas descrições dos ambientes, uma das mais vincadas imagens de marca do estilo narrativo do autor de “Codex 632” e “A Fórmula de Deus”.

O suspense marca presença permanente neste romance que, por vezes, entra em modo automático e particularmente maçador quando Noronha divaga sobre Ciência e Física – apesar da sua pertinência contextual, são momentos contraproducentes para a fluidez dinâmica da trama. Essa é uma das pechas deste livro que tendencialmente, a espaços, arrasta o leitor para longos discursos (ou quase monólogos) centrados nas mentes de, por exemplo, Max Plank, Alberte Einstein, Werner Heisenberg ou Erwin Schrodinger.

Apesar disso, Rodrigues dos Santos consegue construir várias camadas misteriosas que, à medida da sua descoberta, tornam a ação mais fluida, permitindo encaixar as muitas peças de um intrincado puzzle que navega ao longo de mais de 600 páginas, apostando numa narrativa formada por uma sucessão de capítulos que intervalam a trama entre si, conferindo assim um maior dramatismo ao romance que reserva alguns apontamentos irónicos – nomeadamente à fragilidade anedótica da suposta super-competente CIA.

Ainda que tal possa ter relevância subjectiva face ao resultado final, são notórias as comparações entre o universo de Rodrigues dos Santos e o de Dan Brown, “fantasma” que persegue algumas obras do autor português mas que não impede de o afirmar, cada vez mais, como o escritor que mais vende em Portugal.

“A Chave de Salamão” está perto de atingir a invejável marca das 100 mil vendas, sendo que o também jornalista está perto de conseguir a bonita soma de dois milhões de livros vendidos ao longo da sua (super)produtiva carreira. Números à parte, e não sendo a melhor obra de José Rodrigues dos Santos, “A Chave de Salomão” é um livro consistente e vai, de certeza, fazer as delícias dos fãs do autor.

In deusmelivro

Sem comentários:

Enviar um comentário