terça-feira, 20 de maio de 2014

“O Olhar de Sophie”
de Jojo Moyes

Retrato para a eternidade



Estamos em 1916. A Europa está a ferro e fogo e a Primeira Guerra Mundial está ao rubro. Em Somme, uma pequena cidade francesa, Sophie Lefevre sonha com o seu marido Édouard, um pintor impressionista que partiu para a frente para combater o inimigo alemão.

De forma a vasculhar as maravilhas de uma memória envolta de momentos especiais, Sophie tem por hábito contemplar o seu retrato, pintado pelo marido. A ausência de quem se ama deixa profundas marcas num coração que sofre com a ausência e que as saudades dilacera.

Quando os alemães chegam a Somme, o comandante local revela um particular interesse por Sophie que é, agor,a uma mulher disposta a tudo: a arriscar perder entes queridos, a sua autoestima e até mesmo a própria vida, para recuperar o amor da sua vida.

Décadas depois, o retrato de Sophie chega a Londres e às mãos de Liv Halston, que tem nessa obra de arte a única recordação da memória do seu marido que morreu de forma prematura. Mas a vida traz mais desilusões. Liv é confrontada com a eventual perda do quadro, pois o mesmo está a ser reclamado pelos herdeiros e a sua única esperança é Paul, o homem que conseguiu tornar a vida de Liv novamente apaixonante e quetem agora a missão de investigar o seu paradeiro.

É desta forma que podemos traçar o perfil do novo livro da londrina Jojo Moyes. “O Olhar de Sophie” (Porto Editora, 2014) narra a vida de duas mulheres que, apesar de viverem em dois períodos muito diferentes da história, têm em comum uma luta particular – que tem no epicentro a pintura de Sophie – e revelam uma personalidade forte, obstinada e independente, ainda que salpicada por traços de uma fragilidade latente.

Outra das questões que as duas mulheres têm em comum é a pressão a que estão sujeitas, o que as torna em alvos fáceis de crítica por parte quem as rodeia. Neste capítulo, Moyes consegue fazer um interessante diálogo em forma de espelho entre os personagens, apesar das diferentes temáticas abordadas; enquanto Sophie é obrigada e lutar pelo presente e futuro, Liv tem no passado o maior inimigo.

Através de uma abordagem contemporânea, Moyes, por exemplo, confere à personagem de Liv um particular interesse neste livro, pois ao tornar-se viúva de forma muito precoce sente a dor da perda de forma injusta e galopante. É nesse contexto que o quadro de Sophie se torna numa peça fulcral para a sua existência, assumindo-se como o único laço que resta da sua ligação com o falecido marido.

Daí que toda a sua luta seja legitima, justa, clara e óbvia e a escritora, que já venceu o prémio Romantic Novel of the Year por duas vezes – e que editou entre nós livros como “A Baía do Desejo” ou “Viver Depois de Ti” -, consegue trabalhar o personagem de uma forma convincente, competente e apaixonada. Jojo Moyes tem o mérito de humanizar Liv e, ao leitor, é inato o sentimento de identificação com um personagem de corpo inteiro que se encontra (quase) sozinha num perigoso labirinto emocional.

Já com Sophei, Moyes resgata uma excelente dinâmica que tem como palco uma pequena cidade sitiada pelo inimigo. Também aqui a sobrevivência está em jogo, até de forma mais intensa. As emoções desfilam em carne viva através das linhas deste livro e Sophie dispensa a lógica e a ética com o fim de conseguir o seu objetivo.

No fundo, Sophie e Liv lutam por amor e a ligação emocional entre personagens e leitor é inevitável e muito bem recebida. Para isso muito contribui o talento da escrita de Jojo Moyes, que sabe captar a atenção de forma sagaz e eficiente o que torna este romance numa muito agradável surpresa.

Os personagens são credíveis, reais, muito bem desenvolvidos e a escrita simples e direta torna “O Olhar de Sophie” num livro altamente recomendável. Se ainda não conhecida a obra desta autora britânica, eis um bom ponto de partida.

In Rua de Baixo

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