sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Tiago Bettencourt
"Acústico"

Carta de Boas Festas



Primeiro, enlaçou-nos os ouvidos com os Toranja, depois escreveu-nos algumas das mais belas cartas musicais que o panorama nacional conheceu nas últimas décadas e agora, como prenda de Natal, sussurra-nos ao vivo e em acústico.

Para esta nova aventura discográfica, Tiago Bettencourt reuniu algumas das suas melhores canções e, na companhia do seu amigo de batalhas musicais Ricardo Frutuoso, ex-companheiro dos Toranja, de Jorge Palma e Lura, fez um dos mais belos e intimistas discos deste ano que agora finda.

A essência do trabalho, segundo o próprio Tiago, foi fazer “um álbum com um conjunto de músicas que, desde o meu princípio como músico, o público foi escolhendo como preferidas…mas desta vez apresentadas despidas, ao vivo e sem truques”. Sabendo nós que o cantautor é fã do formato unplugged tornado célebre pela MTV durante a década de 1990, aceitar o convite da editora para abraçar semelhante projeto não terá sido difícil.

Assim, no verão deste ano, Tiago Bettencourt saiu da toca e, perante cerca de seis dezenas de convidados, gravou este “Acústico”, que assume um formato de compilação a que o lançamento perto da época natalícia não será alheio.

O resultado é um excitante e intimista registo que apenas nos deixa cheios de inveja por não termos estado no meio dos convidados.

Munido de um talento e simplicidade desconcertantes, Tiago Bettencourt começa o registo com uma maravilhosa “Carta”, de cara lavada, que terá sido o ponto de partida para todo este disco. A partir daqui, a chama que é nossa vai mantendo-se acesa ao longo dos 15 temas apresentados.

A Orquestra Concerto Moderno, Lura e Jorge Palma abrilhantam a festa e é impossível ficar indiferente a este disco, que é, no fundo, uma celebração da própria música enquanto fragmento de poesia cantada e tocada.

Se canções como “Já não te Encontro Mais”, “Jogo” e “Chocámos Tu e Eu” mantiveram uma identidade quase leal, já as versões de “Canção de Engate” e “Pó de Arroz”, de António Variações e Carlos Paião, dois génios do nacional cançonetismo, deram uma alma nova às já brilhantes composições.

De facto, Tiago dá-se, entrega-se, ouve-se e dá vontade de repetir, vezes sem conta. Da sensação ficamos com a certeza de estarmos perante alguns dos novos clássicos da música portuguesa.

As merecidas palmas sucedem-se ao longo do disco e as excelentes canções também. “Só Mais uma Volta”, “Cenário”, “Eu Esperei”, “Caminho de Voltar” e o inédito “Temporal”, cantado em uníssono, são pérolas encontradas nesta ostra em formato acústico.

“Laços” é a única música que merece bis e o disco termina na companhia de Jorge Palma. Um final muito bonito e solene, que nos faz ficar com água na boca, pois queremos mais, queremos provar outra vez.

Alinhamento:
1. Carta
2. Canção Simples
3. Canção de Engate
4. Já não te encontro mais (com Lura)
5. Os dois
6. O jogo
7. Só mais uma volta
8. Laços
9. Chocámos Tu e Eu
10. Pó de Arroz
11. Cenário
12. Eu esperei
13. Caminho de Voltar
14. Temporal
15. Laços (com Jorge Palma)

Classificação do Palco: 8/10

In Palco Principal

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Rodrigo Leão
"Songs 2004-2012"

Canções com sotaque inglês



Longe vão os tempos de Rodrigo Leão enquanto membro da Sétima Legião e dos Madredeus. Os ecos cinzentos da Manchester dos anos 1980 ficaram para trás e, ao optar por uma carreira a solo, Leão deu um importante e definitivo passo na sua afirmação enquanto músico.

De forte influência neoclássica, os seus primeiros trabalhos denotavam a coabitação de universos musicais de gente ilustre como Micheal Nyman, Win Mertens e o lado mais clássico de Ryuichi Sakamoto, onde o espírito minimal estava bem presente.

Em 1993, quando lançou o seu primeiro trabalho a solo e “Ave Mundi Luminari”, Rodrigo Leão abriu um novo caminho para a música nacional e um espaço para explorar.

“Mysteruim”, “Theatrum” e o bem-sucedido “Alma Mater” foram surgindo com naturalidade, tendo como filosofia a utilização de um misto de instrumentos clássicos e eletrónicos, assim como a presença do latim como língua “universal”, alicerçado em vozes de cariz lírico.

O relativo sucesso da música de Leão levou à edição de dois discos que indicavam uma mudança de rumo na carreira do compositor. Se “Pasión”, álbum ao vivo, já revelava uma tentativa de chegar ao formato canção mais tradicional, “Cinema”, um dos discos charneira da música portuguesa na década de 2000, mostrava um Rodrigo Leão mais maduro musicalmente e a dar voz às suas composições, conseguindo mesmo colaborações importantes de nomes como Beth Gibbons, vocalista dos Portishead, e do mestre Sakamoto. Também Sónia Tavares, vocalista dos The Gift, deu alma a três canções do álbum, duas cantadas em inglês e uma em francês. Estávamos perante a génese deste “Songs 2004-2012”.

Mais tarde, em 2009, no disco “Mãe”, que Rodrigo Leão dedicou à sua entretanto falecia progenitora, a atmosfera nostálgica do trabalho trouxe mais duas participações de luxo ao seu reportório. Niel Hannon, dos Divine Comedy, e Stuart Staples, dos Tindersticks, aceitaram o convite do músico português e abrilhantaram o álbum. A portuguesa Ana Vieira, que costuma acompanhar ao vivo Rodrigo Leão, cantaria também neste disco “Sleepsless Heart”.

E é assim que chegamos a esta nova aventura de Rodrigo Leão. Segundo o compositor, “Songs 2004-2012” é a primeira parte de uma possível trilogia, pois os outros dois discos, de “ambientes mais ibéricos e atlânticos”, ainda só ecoam na cabeça de Rodrigo Leão e podem mesmo ficar na gaveta da sua memória.
Este disco em particular surge em forma de “coletânea", com temas do reportório de Leão cantados em inglês - a maioria já editados anteriormente.

Ainda assim, existem três novidades deste disco. A abrir, Rodrigo Leão oferece “The Long Run”, um belíssimo tema cantado por Joan as Police Woman, sendo que o australiano Scott Mathew dá a voz a “Incomplete”. A outra música nova do disco é, como exceção que confirma a regra, o instrumental “Last Words”.

Na prática, este “Songs 2004-2012”, não acrescentando muito à discografia de Rodrigo Leão, revela-se um bom ponto de partida para conhecer o lado mais “cantado” do compositor e é sempre um deleite ouvir tão boa música e excelentes vozes.

Alinhamento
1. The Long Run – voz de Joan as Police Woman (tema inédito);
2. Deep Blue (Album Version) – voz de Sónia Tavares;
3. Happiness (Album Version);
4. Sleepless Heart (2012 Edit) voz de Ana Vieira;
5. Cathy – voz de Neil Hannon;
6. Lonely Carousel (Album Version) – voz de Beth Gibbons;
7. Lost Words - instrumental (tema inédito);
8.Terrible Dawn – voz de Scott Matthew;
9. This Light Holds So Many Colours – voz de Stuart Staples;
10. Incomplete – voz de Scot Matthew (tema inédito)

Classificação do Palco: 7/10

In Palco Principal

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Matt Corby @ Santiago Alquimista

Ídolo sem pés de barro



Num sábado com muito frio e nevoeiro à mistura, a sempre simpática sala do Santiago Alquimista acolheu, pela primeira vez em Portugal, Matt Corby, um rapaz australiano que deu os primeiros passos no mundo da música no conhecido reality show “Ídolos”, edição Austrália.

Matt Corby encantou os antípodas com apenas 17 anos mas, desde aí, a sua ascensão calma e ponderada levou-a à edição de alguns EPs recheados de magníficas canções. Muitas vezes comparado a nomes como Nick Drake, Jeff Buckley, e Justin Vernon, Corby é detentor de uma voz fantástica, que muda de registo com uma facilidade incrível, mantendo uma afinação acima de qualquer suspeita.

Assim, com tantos elogios, não se estranhou que o Santiago Alquimista registasse lotação esgotada para receber Matt Corby e seus amigos. A intimidade que a sala permite faz com que o público esteja muito próximo dos artistas, o que é sempre importante para aumentar a tão desejada cumplicidade entre quem está em cima do palco e quem assiste ao espetáculo.

Como anteriormente se referiu, para muitos Corby é ainda um “ídolo”. A primeira fila da assistência revelava isso mesmo. Dezenas de jovens raparigas, de máquina em punho e sempre prontas para soltar um gritinho de devoção, estavam a postos para prestar a devida “vassalagem” à sua estrela.

Mas que Corby seria esperado? Ao longo do (curto) concerto, Matt provou que está muito longe do tal rapaz de 17 anos dos “Ídolos” e é hoje um cantor adulto. A sua música amadureceu. As suas canções revelam-se intimistas, serenas e, acima de tudo, seguras de si.

Bem perto das 22h00, Matt Corby aparece em palco numa posse de anti-herói. Sozinho e apenas com a guitarra como companhia, oferece ao público um “Big Eyes” extremamente belo, cantado de uma forma muito próxima do registo de Jeff Buckley. O silêncio da sala era quase total e apenas o barulho dos motores das máquinas fotográficas contrastava com a beleza da performance do cantor. Estava dado o mote para a próxima hora.

“Kings, Queens, Beggars and Thieves” foi a segunda música da noite, quando em palco se juntavam os restantes amigos de Corby. Mais encorpado, muito por culpa da atuação da banda, este segundo tema, assim como outros que foram tocados, ganha outro brilho quando Bree Tranter, teclista, empresta a sua suave voz para os coros.

Um dos momentos mais altos da noite aconteceu com “Runaway”. A excelente introdução do tema, pautado por guitarras planantes e uma bateria a marcar o compasso, revelou a muito competente química que existe entre todos os membros da banda. Mas por muito que os instrumentos brilhassem, era a voz de Matt Corby que mais se destacava. Antes de “Made of Stone”, muito bem recebida pelo público, Corby fez questão de apresentar os seus companheiros de estrada. Para além da já referida teclista, a banda conta ainda com Chris na bateria, Johnny na guitarra e Kevin no baixo. Corby troca de posição com Bree e ocupa o piano. As cabeças das jovens na primeira fila movem-se sempre em direção do seu herói…

Segue-se uma das mais conhecidas faixas de Matt Corby. “Brother” traz de volta o cantor à guitarra e ao seu lugar natural, que é frente ao(s) microfone(s). Com o público a acompanhar a canção, Matt Corby entrega-se de alma e coração e canta em bicos de pés, para que a sua voz chegue ainda mais alto. E, de facto, consegue.

Como excelente contador de histórias que é, Matt Corby, em jeito de confissão, fala de “Letter”, uma missiva que foi o acto final de uma paixão que pouco durou, mas que marcou o coração do jovem australiano. A sala escutou, em silêncio, o que Corby contou e, essencialmente, cantou. E, durante uns minutos, o tal coração despedaçado sarou e curou cicatrizes passadas.

A seguir, e antes do encore, “Untitled” e “ Souls A Fire” levaram-nos por mais uns momentos a sentir a fantástica voz de Corby, muito bem secundada pelos restantes músicos. Por instantes, somos transportados para um ambiente blusy aconchegante que revela pormenores de jam session.

Aquele que foi, infelizmente, um dos concertos mais curtos que assistimos este ano, não deixou de contar com um encore que trouxe a palco mais duas excelentes performances. Primeiro, Corby, entregue à sua guitarra, despiu até ao tutano “Lonely Boy”, um original dos The Black Keys (que recentemente passaram por Lisboa), e arrancou do público uma das maiores ovações da noite. O final perfeito surgiu com “My False”, um tema bastante pedido pelos presentes que tiveram a ocasião de ver um concerto muito, muito competente e inspirado.

Cerca de uma hora depois de começar, a atuação de Matt e camaradas de estrada leva-nos a desejar que o muito aguardado álbum chegue em breve. Se neste sábado o Santiago Alquimista pareceu a sala ideal para um concerto destes australianos, no futuro vai ser complicado ver Corby de tão perto…

In Palco Principal

Maximo Park
TMN ao Vivo

A velocidade (é) deles



Naquela que foi a primeira data da mais recente digressão europeia, os cinco de Newcastle trouxeram a habitual competência, profissionalismo e simpatia que caracteriza as suas atuações. Com a sala inesperadamente aquém das expectativas (olá, crise?), os Maximo Park entraram, um a um, sendo o carismático líder Paul Smith o último a pisar o palco da sala lisboeta.

Vestido de preto, e ainda de casaco, Smith, na companhia do inseparável chapéu, entoou os primeiros versos de “When I Was Wild”, o mais curto e calmo dos temas de “National Health”, o mais recente disco da banda. De seguida, a banda atacou o tema homónimo do disco de 2012 e a energia estava à solta na sala ribeirinha.

Com apenas um “muito obrigado” pelo meio, surge o primeiro tema do álbum mais reconhecido pela crítica, “Our Earthly Pleasures”, de 2007. “Girls Who Play Guitars” arrancou aplausos nos presentes. A boa vibração seguiu-se com mais um tema de “National Health” e “Until the World Would Open” fazia os presentes gritar: “I won’t survive but i intend to have a good time”. Agradado com a entusiástica receção dos presentes, Paul Smith confessa a alegria de poder voltar a Portugal e, ao fundo, chegam os acordes, inicialmente, sussurrados de “Hips and Lips”, uma das canções mais elétricas e contagiantes da banda.

“Graffiti”, um dos hinos mais conhecidos dos Maximo Park e que mereceu um novo arranjo na introdução, leva-nos até 2005, quando a banda editou o seu primeiro trabalho, “A Certain Trigger”, que conseguiu a proeza de vender mais de 300 mil cópias no Reino Unido.

A proximidade do Tejo inspirou a banda que se lançou em dois temas de cariz “marítimo”. A “The Coast is Always Changing” de “A Certain Trigger” seguiu-se “Waves of Fear”, de “National Health”. Pelo meio, Smith e o Teclista Lukas Woller manifestavam o seu gosto pelo mar, seja ele fluvial ou atlântico.

A primeira incursão ao terceiro álbum da banda, “Quicken the Heart”, de 2009, foi com “The Kids Are Sick Again”, outra das grandes canções dos Maximo Park. Paul Smith, com uma entrega excecional, de megafone na mão, gritava a plenos pulmões. De clássico em clássico, o começo sintético punk de “Limassol” fez a pouca mas entusiasta assistência saltar bem alto.

Num registo mais calmo, “The Undercurrents”, um dos temas mais belos da banda e com um refrão orelhudo, enchia a alma dos presentes, que registavam com agrado a cumplicidade e harmonia entre os cinco elementos da banda, em grande forma. Depois, “Write This Down” contou com a ajuda do público quando Paul Simth desceu do palco e pediu que apresentassem a música na língua de Camões. O desejo foi satisfeito por uma alma feminina. “Take me Home” foi o momento da noite que se seguiu, ainda em território de “National Health”.

“Now I’m All Over The Shop”, outro tema de destaque de “A Certain Trigger”, leva-nos ao universo mais cru dos Maximo Park e, durante pouco mais de dois minutos, esquecemos tudo e ficamos entregues à música. Depois, “This is What Becames of The Broken Hearted”, revela uns Maximo Park à beira do colapso romântico, com destaque para o piano a conferir uma atmosfera mais intimista. Já “Going Missing” acelera a contenda e Simth grita pelo ressentimento.

De novo em “The Eartlhy Pleasures”, “By the Monument”, meio a pedido do público, é responsável por mais uma bela descarga de energia. Smith defende um pouco a voz, mas a energia não denota perdas e as teclas de Wooller ganham vida própria. “Books from Boxes”, bastante saudado, é alvo de mais uma excelente prestação da banda. Aplausos, agradecimentos e a “última”. “Aplly Some Preasure” é, talvez, o exemplo perfeito para definir os Maximo Park: entrega, prazer e talento.

A curta saída de palco fazia prever um encore e, de regresso, mais três excelentes momentos. “Pride Before a Fall”, um tema de 2004 em plena estreia ao vivo, segundo a banda, assentou que nem uma luva. A seguir, “I Want You to Stay” assumiu o papel de confissão desesperada e, como a cereja no topo de um bolo agridoce, “Our Velocity” fechou da melhor forma um concerto muito bem conseguido.

Antes dos Maximo Park, atuou o quarteto alfacinha Lissabon, banda que se mexe por uma amálgama de influências, que vão desde o psicadelismo dos 1970 até a registos indies, passando por um atraente synth pop característico do início dos 1980. No momento a promover o seu primeiro álbum, “If it’s Only Just a Dream”, os Lissabon são, na voz e guitarra, Pedro Lourenço, nas teclas Soraia Limão, no baixo e back vocals Inês Vicente e na bateria José Garcêz. Ao longo de cerca de 30 minutos, os Lissabon estiveram seguros, e, aos poucos, foram agarrando o público que já vai conhecendo temas como “Everytime (you Save the World)” e “I Promise, I Promise”. Sem dúvida, um projeto a ter em conta num futuro breve.

In Palco Principal